Olho em volta. Estou ali. Naquele momento estou ali. Se perguntarem como, ou porquê, terei uma resposta, mas dentro de mim, duvido se terá, realmente, sido assim.
Porque terei vindo? Pela paixão de me encontrar? Pela dor do que foi perdido no caminho? Por não ter um caminho. Por nada ter de que me orgulhar. Ou por me orgulhar de tudo.
Não importa. Cheguei.
E caminho, passo a passo. Olho em volta. Outros ali se encontram. De vários locais, idades, experiências. Mas ali estão. De uma forma ou de outra, chegaram todos, ao mesmo tempo, àquele mesmo ponto. E espelham-se uns aos outros.
Oh, mas há uns... que luminosos! Parecem tão bonitos, criativos, alegres, inteligentes. E outros... hmmm, não. Sombrios, chorosos, tristonhos, ressentidos, feios!
“São todos tu!!!”
O quê? Como? De onde veio esta voz? Ouvi-a, tenho a certeza. O que me disse... não faz sentido! O que há em mim assim, tão belo? E o que existe em mim de tão feio? Não consigo abrir os braços a nenhum...
Estou aqui, no entanto. E decido caminhar.
Entro na dança, primeiro, com passos inseguros....
... depois, dou por mim a entregar-me.
Dou mais um passo. Dói. E mais outro. Agora não quero, não quero ir mais fundo, chega-me estar aqui. A cada passo, um desafio, lá fora. Como se a vida soubesse o que ando a fazer. Como se me testasse, cada vez que regresso a casa. A aplicação prática do laboratório.
“Como seria se caminhasses mais e mais?”
A voz, novamente... volto a olhar para os outros. Os meus espelhos! Alguns percorrem o caminho velozes como o vento. Outros não, colocam cuidadosamente os pés no chão, como se precisassem de confirmar que não vão cair.
O que me reflecte tudo isto? Que... devo caminhar ao meu próprio ritmo????
Ai... lá vou eu de novo. Mais um passo.
“Entrega-te!”
A voz... novamente a voz. Quem és tu?
“Entrega-te!”
Não consigo! Não posso fazer mais. Dói.
“Podes fazer TUDO!”
Seja... mais outro passo! E... dou por mim a descer. Já não vejo o chão, nem as paredes. Apenas caminho, sei que nada mais há para fazer! Há dias em que tenho medo. Outros em que sinto certezas inabaláveis! Há dias em que não consigo aceitar aquilo que vejo, em mim, nos outros, na vida, nas escolhas que fazemos. Outros dias em que tudo, de alguma maneira, me parece fazer um sentido louco, inexplicável.
E outro passo. Estou pesada, cansada. Começo a tirar o peso. Sapatos, mochilas, roupas, memórias, padrões, dores, ressentimentos, mágoas. Caminho tão mais facilmente, se deixar cair tudo isso... engraçado... por vezes é tão difícil largar uma memória feliz, quanto um pensamento tóxico. Agarram-se a mim como cola. Respiro. E puxo, arranco dores e lágrimas e pele e gritos de solidão. Porque me agarro tanto a estas coisas? Perder-me-ei de mim mesma?
“Nada disso és tu.”
Oh, a voz.... cada vez me incomoda menos. Parece, até, que a conheço.
Caminho e danço, o corpo mais dorido e mais leve. E a minha alma mais entregue.
...
Hoje, cheguei a uma lagoa iluminada, dentro da gruta onde caminho há tanto tempo. Os meus irmãos, caminhantes como eu, estão lá. Olho-os atentamente. Os feios já não me parecem feios. E os lindos, já não são tão lindos, inalcansáveis. De alguma forma, amo-os. Aceito-os. E, por isso, a sua luz é-me tão familiar... assim, despidos de peso, como eu.
Vou até à lagoa e olho para o meu reflexo.
Ah... serei eu? Aquela? Tão... leve? Luminosa? E também sombria... porém, inteira! Exactamente como os caminhantes meus companheiros.
“São todos tu!”
Ah, a voz... daí a conheço. Sou eu mesma que falo... e nem conhecia a minha própria voz.
Estou pronta para regressar.
Criando espaço para os meus passos. Perdendo certezas e ganhando outras. Abraçando tudo. Descobrindo tudo o que sou. Aceitando o medo, e a dor, e o riso... e a beleza. E o amor! Que existe em tudo. Que brota de mim... a cada inspiração.
Integro nos meus passos, tudo o que sou, tudo o que quero, o Universo inteiro dentro dos meus braços. E conhecendo o segredo. Um passo de cada vez, ao meu ritmo e num profundo e longo acto de fé.
Setembro 2011
(Escrito para a tribo WCI)
