quinta-feira, 26 de junho de 2014

Regresso

Tive hoje uma primeira consulta com uma paciente nova.

Durante os últimos meses diminuí muito as sessões e não aceitei pacientes novos, porque nunca sabia se me iria sentir bem ou não durante a semana.

Hoje recebi uma paciente nova. Mulher, 41 anos, ansiedade, ataques de pânico, muitas questões de afectos.
Ouvi-a durante muito tempo. A relação terapêutica - em mim - foi quase imediata. Ou então estava tão disponível que recebi aquela mulher em mim tal qual tatuagem.

Uma mulher perdida, sem sonhos de futuro, sem saber que ainda podia sonhar. um mulher que um dia fantasiou ser especial, e assim que deixou de acreditar nisso, deixou de ter fogo na existência. Ataques de pânico que lhe surgem, como abanões da sua alma, para que se olhe, veja, abrace. Para que coloque as mãos no peito, de mansinho, e sussurre: "estou aqui para ti".

A determinada altura, entre lágrimas e numa voz entrecortada, diz-me:
- Sou uma pessoa simples. E gosto de sê-lo.

E eu também gosto - tanto! - disso.De pessoas simples, autênticas, de carne e pele e sangue. Pessoas cujos olhos me encaram quando falam, que não têm medo de se desnudar, apesar da própria vida as assustar. Pessoas que carregam o seu melhor, sem pensar se isso é bom ou mau.

A magia acontece no silêncio entre as frases. Não sei explicá-lo. Com algumas pessoas, simplesmente SEI que vai correr bem. Por isso, acolho. Permito que as perguntas não interfiram no silêncio. Somente as faço quando necessário. E a história que ela me vai contando, vai sarando as primeiras feridas de outras que surgiram.

Diz-me no fim.
- Gostei tanto de estar aqui. Gostei tanto de si.

E eu sei que é verdade. Eu gostei tanto de ali estar. E gostei tanto dela.

E mais uma vez agradeço à Vida este aqui e agora onde me encontro.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A Noite Escura da Alma



Chega de mansinho e arrasta-me com ela. Não precisa de nome, só de espelhos. Devolução a mim própria. De crenças, expectativas, sonhos, ilusões, mentiras que contei a mim mesma para adormecer melhor.
Está escuro e só aí faz sentido estar em silêncio.
Por vezes ergo-me, "porque não nasci para estar parada", "porque o sofrimento é uma perda de tempo", "porque a vida é tão mais do que isto", mas sento-me outra vez, quase a rir de mim mesma. Mais mentiras, mais enganos, mais fugas para a frente. Tudo isso é real, só não o é para mim, aqui e agora.
Nem sempre tenho perspectivas, ou lucidez, ou racionalidade. Nem sempre sei ser a mãe de mim mesma, o meu príncipe encantado, a mulher da minha vida.
Hoje não posso ser nenhuma dessas coisas. Não quero? Talvez...
Hoje está frio dentro de mim.
E não faz sentido levantar-me, quando não faço ideia de por onde caminhar...
Aceitar o tempo. Confiar em mim...
Sento-me neste canto, descanso a cabeça nos joelhos, e aguardo...

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Ser ou não ser...

Alguém me dizia, no outro dia, em resposta a uma proposta para um exercício, que o tinha feito, que correra bem, mas que quanto mais tempo de qualidade passava consigo mesma, mais resistência colocava em estar com os outros.

Esta conversa levou-nos a profundezas da alma, e nesses rios da consciência, outras ideias surgiram. Porquê a maior dificuldade em estar com outros, depois de entrar em intimidade connosco mesmos? Em que circunstâncias, que outros, que relacionamentos estão nessa base?

A verdade é que na maioria das vezes, os padrões de acção, sentimentos, pensamentos não são livres, não são criativos, não são, pura e simplesmente, meus. Estão aqui, é certo. Posso vivê-los em verdade e defendê-los com total rigor. Mas geralmente não foram ESCOLHIDOS por mim. Somente impressos na pele e memórias, entre as noções de Bem e Mal que me ensinaram, seja através de palavras ou de comportamentos.

Quando atingimos aquela idade em que colocamos os ensinamentos (das nossas figuras de autoridade) em causa, por muito que estrebuchemos, a maioria delas faz parte dos nossos ossos e quando a idade, a experiência e o tempo nos acalmam os instintos, damos por nós a dizer, agir, fazer aquilo que já se fazia entre os "nossos". Por vezes, saímos um bocadinho da caixa. Mudamos o palavreado, a religião, as profissões. E mantemos os padrões.

Mesmo quando reflicto a sério sobre os conceitos sobre os quais vivo e, pelo mergulho profundo através de mim, da luz e da sombra, do que o meu coração me pede e do que a experiência do tempo e do amor me trás, se encontro a "minha" verdade, os meus anseios internos e neles assento raízes, há momentos em que eles são esquecidos e colocados de lado. Por pura distracção.
Querendo isto dizer que Ser-se Inteiro nem sempre é assim tão simples. A distracção, a rotina, o não estar presente, centrada em mim leva-me ao que foi impresso há muito mais tempo. Aos padrões familiares, ancestrais, a tudo o que a minha criança acreditou como verdade, pois os seus "mais que tudo" assim o faziam.

Quando me distraio, não sou livre. Sou aquilo que fizeram de mim. Não possuo o poder da escolha consciente, da responsabilidade pelos meus próprios preços. Quando me distraio sou as expectativas dos outros, o resumo daquilo que um dia acreditei que era a vida. Quando estou fora de mim, não sou eu.

Ser eu, implica estar presente. Ser eu, implica respirar-me a cada instante, vibrar com cada segundo, estar aqui e agora. Por isso nos ensinam meditação. Por isso nos pedem para viver o presente. Porque é a única forma de, efectivamente, Existirmos. E nesses momentos, os relacionamentos que mantemos com base naquilo que "esperam de nós", achávamos que éramos ou "devíamos ser" começam a tornar-se profundamente desconfortáveis. E há um trabalho profundo a fazer neles. E muitos preços a pagar.

Por vezes é necessário repetir-se muitas e muitas vezes para nós "eu estou aqui, presente. Eu escolho quem sou e o que faço. eu escolho o que penso e como quero sentir.", até que comece a tornar-se verdade.
E é nessa altura que cada passo começa a deixar uma marca única no caminho.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Litha

Quando o tambor e a voz se unem num beijo devorador e os meus olhos pousam o fogo, a ancestralidade em mim desperta.
Nada existe, a fogueira pertence-me e é intemporal. Faz parte de todas as fui.
O corpo desperta para os movimentos da terra... as curvas das montanhas na minha pélvis, os rios e as cascatas no meu sangue, as flores e as borboletas no meu cabelo.
Quando danço na fogueira, sou feiticeira. Não há ninguém. Só o fogo e a memória das minhas células. A pele. Os meus pés descalços no chão. O riso que me desenha o rosto.
Arregaço as saias e salto com um grito. O calor nas minhas coxas. A purificação.
"Fogo sagrado, purifica-me. Cantar para viver. Fluir para viver. Água, terra, fogo e água."
Lá no cimo, o crescente brilhante da LUA espreita-me com um sorriso. Conhece como ninguém a minha alma e os meus anseios.

Quando danço a espiral no fogo, os meus pés conhecem e traçam o caminho antigo. Encontro mãos e olhares, e rostos e sorrisos. Devolvo com amor. E continuo seguindo o trilho que conheço sem conhecer.
Sou poder. Sou alegria. Sou sexualidade, fogo, vida. Sou a própria fogueira.
Solto o corpo com amor.
E desperto.
Agradeço o fogo e as estrelas.
Feiticeira sou.
Assim é.
24.06.2012

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Dias intensos

De alguma forma absolutamente incrível dou por mim a sentir-me mais sacerdotisa do que nunca. Os últimos dias... meses?... trazem-me a intensidade que só o Plutão poderia mostrar-me.. ainda e sempre Hades na minha vida. Desde a incisão mais profunda, ao mais sublime dos arrebatamentos.
Grata. Mil vezes grata.
E se há momentos em que não me sinto digna de tanto, das formas (ir)reais como sinto as coisas, as pessoas, os instantes mágicos, noutros a vida espelha-me o quanto era ali que precisava de estar. E que cumpri aquilo que era esperado pela vida.
Quão assustadores se podem tornar os dias quando vivemos para cumprir-nos... e quão duros se tornam os ecos do mundo. O equilíbrio... cada vez mais rapidamente reposto. A sombra que se solta de qualquer pensamento e vem cantarolar-me ao pescoço.
A sensação arrogante de que não estou ainda lá... tão arrogante quanto acreditar que estou... estou, afinal, onde tenho de estar, não é essa a minha grande aprendizagem?

De qualquer modo, a lição da sacerdotisa ensinou-me coisas únicas. Que quando a permito SER, sou também mais tudo... mais genuína, mais entregue, mais sábia, mais mulher!
Caminhemos os próximos passos...

quarta-feira, 21 de março de 2012

Ostara

O equinócio traz-nos este equilíbrio entre sombra e luz.
Saímos do sofá confortável, apagamos a lareira quente, saltamos dos trilhos mais profundos da nossa alma e abrimos as janelas, as roupas leves e os sorrisos.
Este é o tempo dos reencontros. Com os nossos sonhos, amigos, parceiros, objectivos. É o tempo dos amanheceres. Dos novos dias.
Perséfone deixa o Submundo e junta-se à Deusa da fertilidade e dos Campos, sua mãe. Trás consigo a Primavera e o fruto do seu encontro com Hades. O mistério.
Abrem-se as janelas, plantam-se as sementes consagradas no Imbolc, pintam-se ovos e sente-se a vontade de dançar. De sentir o corpo e a brisa no cabelo.
Os dias crescem, como o nosso fogo interno, e a vontade de focalizar na vida.
Brindemos.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Balanço


Este ano, depois de fazer o meu "Mapa do Tesouro", percebi várias coisas.
A primeira delas foi que a minha mente/ consciência /alma / capacidade de encaixar o mundo, expandiu... a tela que comprei era o dobro da tela do ano passado, apesar de a ter adquirido convencida de que era do mesmo tamanho... só em casa me dei conta de que o que era "grande" o ano passado, este ano já não parecia assim tão grande.
Outra das coisas que percebi foi que, apesar de ter enchido a tela de desejos, sonhos, palavras inspiradoras, imagens maravilhosas e cor... pedi muito menos coisas... e focalizei-me muito mais em algumas coisas.
Não preciso de muita coisa, mas sei cada vez mais e melhor aquilo que quero.
É uma sensação maravilhosa entender - finalmente - numa dimensão anteriormente não ouvida, as notas com que toca a minha alma, as cores com que pinta e as formas que gosta de moldar.
Os preços a pagar por isso não são menos difíceis. Agora é tempo de despedir-me do que não quero, limitar as minhas escolhas - e sim, isso chama-se liberdade, por paradoxal que seja - e focalizar-me cada vez mais em quem sou. Quem diria que sermos uma melhor versão de nós mesmos é algo tão facilmente "escapável" por entre os dedos e as rotinas?
Ando assim, nesta roda viva de luz e sombra, tecendo nas pontas dos dedos uma nova história... onde danço com vestidos vermelhos compridos, com mangas largas, como um dia me foi descrito... ah... e continuo despenteada.
Basicamente, sou mais feliz.